O Exorcista: 50 anos após o lançamento, clássico do horror ainda tira o sono
Em algum lugar entre a ciência e a superstição, existe um outro mundo. O mundo das trevas.
Publicado em 23 de março de 2022, por João Schiavo • Artigos, CinemaQuando você ouve o título O Exorcista, o que lhe vem à cabeça? O pescoço da Regan virando em 360 graus? O censurado spiderwalk na escada? Os vômitos verdes produzidos com sopa de ervilha? Ou aquele inesquecível frio na espinha?
Eu fico com a última opção, porque ela contempla todos os sentimentos que carrego dessa obra. Lançado em 1973, muito antes do mundo sonhar com efeitos especiais grandiosos, produzidos com maestria — e, graças ao universo digital, até uma certa facilidade —, O Exorcista é um marco na história da sétima arte.

(Warner Bros. Pictures/Reprodução)
Inspirado por um caso real ocorrido em Cottage City, nos Estados Unidos, o filme aborda a história de uma possessão demoníaca sofrida por Regan MacNeil (Linda Blair), uma garota de 12 anos, enquanto traz em paralelo o paradoxo entre a fé e a descrença, desfecho protagonizado pelo Padre Damien Karras (Jason Miller).
Dirigido pelo genial William Friedkin e escrito por William Peter Blatty, baseado no livro homônimo de sua autoria, O Exorcista é o grande responsável pela virada de chave do horror no mundo contemporâneo. Seu lançamento, controverso e polêmico, arrastou multidões às salas de cinema e causou histeria coletiva em todos os cantos do planeta. Desmaios, vômitos, pessoas fugindo no meio da exibição, filas quilométricas com curiosos pela novidade e até mesmo uma excursão britânica, intitulada Exorcist Bus Trips, na qual as pessoas iam de ônibus até o cinema mais próximo para que pudessem assistir ao filme — que acabou sendo proibido em diversas cidades da Europa.

Cinemas lotados, confusão e medo: os anos 70 nunca mais foram os mesmos depois desse horror midiático. (Hulton Archive/ Reprodução)
Tá Amarrado!
Muitos mistérios rodeiam os bastidores de O Exorcista. Dezenas de relatos afirmam que acontecimentos bizarros respingaram na vida real dos envolvidos na obra, e tornaram-se até rotineiros no set de filmagens. O primeiro deles foi com o ator Max von Sydow, o Padre Merrin, que durante a produção descobriu que o seu irmão havia morrido.
A seguinte foi quando uma esposa grávida de um assistente de câmera perdeu o bebê. Durante as gravações, o conjunto de filmagens pegou fogo de forma misteriosa e, curiosamente, apenas o quarto da personagem de Linda Blair não foi atingido. Coincidência ou não, nessa locação ocorreram todas as cenas que constroem a trama e o derradeiro ritual de exorcismo.
O Mal vende… e muito bem!
Caso é que, mesmo com as lendas urbanas, muitos acreditam que essas histórias não passaram de uma estratégia certeira de marketing, com a finalidade de atrair cada vez mais pessoas aos cinemas. Se é verdade ou não, nunca teremos certeza, mas a conversão funcionou direitinho: o filme é, oficialmente, a maior bilheteria de terror da história, com US$2,6 bilhões de lucro para a Warner Bros. Pictures. Todos os números somam bilheteria nacional e internacional, e foram corrigidos pela inflação. Bem que a refilmagem de It: A Coisa (2017) tentou fisgar o primeiro lugar, mas Regan e sua turma não cansaram do topo.
One Hit Wonder (Literalmente)
Com o estrondoso sucesso do filme, não demorou para que uma sequência fosse encomendada. O que ninguém podia prever (ou podia, mas infelizmente não o fez) é o tamanho do desastre dessa segunda parte. O Exorcista II – O Herege, dirigido John Boorman e escrito por William Goodhart, foi um fiasco em todos os aspectos: massacrado pela crítica, rejeitado pelo público e esquecido até pelo maior dos fãs; essa continuação foi um erro colossal e é facilmente colocada na gaveta de piores produções da história do cinema. Nem o retorno de Linda Blair com a personagem original salvou a obra do fracasso.
Como desistir não faz parte da arte, um terceiro capítulo foi produzido no início dos anos 90, dessa vez com o retorno de Blatty como diretor e roteirista. Com a alcunha de O Exorcista III, o filme baseado no livro Legião, também de Blatty, é uma produção excelente, com uma história bem amarrada e assustadora, mas com mínimas relações à produção original. Seria mais fácil batizar o filme com outro título, mas quando se tem um hype para surfar, a prancha já está pronta. Mesmo com a qualidade indiscutível, a terceira parte da história não chegou nem perto do sucesso da primeira e se mantém distante do fracasso da segunda. Basicamente, nem ao céu, nem ao… inferno? Bem, talvez ao inferno…
E, por fim, em 2004, aproveitando a febre dos lançamentos de terror na época, surgiu o esquecível Exorcista – O Início, dirigido por Renny Harlin e escrito por Alexi Hamley, com base na história de William Wisher Jr. e Caleb Carr. É um prelúdio do filme original de 1973, mas poderia simplesmente nunca ter existido. Arrastado, sem contexto e confuso, o filme é um apanhado de sangue, jumpscares falhos e uma direção pífia. Com a pontuação de 10% baseada em 134 avaliações, o site Rotten Tomatoes traz o consenso de que a produção é “um filme de terror sangrento medíocre, nem perto da qualidade do original de 1973”.
O Exorcista teve ainda um prólogo batizado de Domínio – Prequela de O Exorcista, dirigido pelo renomado Paul Schrader, mas que foi tão bagunçado que acabou sendo, primeiramente, arquivado, e depois lançado em DVD. E em 2016, a Fox renasceu a história através da excelente série O Exorcista, estrelada pelo ex-RBD Afonso Herrera e pela ótima Geena Davis, que contou com duas temporadas e abordou de forma respeitosa e bem produzida a narrativa original.
O futuro a Pazuzu pertence
Em 2020, a produtora Blumhouse anunciou que havia adquirido os direitos da obra e que estava desenvolvendo um reboot do clássico, aos moldes do que ocorreu com Halloween, em 2018. Criado para configurar uma nova trilogia, os longas estão em estágio de pré-produção. O primeiro deles já tem, inclusive, informações concretas: a direção ficará por conta de David Gordon Green. Ellen Burstyn retornará como Chris MacNeil, do longa original, enquanto Leslie Odom Jr. também aparecerá como o protagonista, no papel de um pai cuja filha é possuída por um espírito demoníaco. O lançamento do primeiro filme ocorrerá em outubro de 2023 e promete respeitar o legado do clássico, ao mesmo tempo em que construirá uma nova narrativa para a Geração Z.

Ellen Burstyn e Linda Blair em uma das cenas cruciais do filme. (Warner Bros. Pictures/Reprodução)
Curiosidades Arrepiantes
- O Exorcista foi o primeiro filme de terror da história a ser indicado ao Oscar. Foram dez nominações, incluindo melhor atriz coadjuvante para Linda Blair, e duas estatuetas: melhor roteiro adaptado e melhores efeitos sonoros.
- A pós-produção do filme foi feita num estúdio na Fifth Avenue, em Nova York, no número predial 666. Coincidência ou maldição?
- Para reproduzir os terríveis gemidos de Regan, William Friedkin gravou os ruídos estridentes de porcos sendo levados para o abate em uma fazenda próxima ao set.
- Friedkin não poupou esforços para assustar seus atores, chegando a dar tiros no ar sem avisar ninguém no meio das filmagens. Ele ainda encomendou um freezer gigante para “esfriar” o set. Linda Blair, no entanto, só usava sua camisola nas cenas e acabou pegando pneumonia.
- O pastor evangélico Billy Graham pregava que todas as fitas VHS com o filme estavam possuídas pelo demônio. Quem a comprasse corria sérios riscos de ser possuído. Mesmo assim, as vendas do longa bateram recordes. A curiosidade venceu o medo!
Disponível no HBO Max na versão censurada e sem cortes (subintitulada A Versão Que Você Nunca Viu), O Exorcista é uma das obras mais necessárias da história. Quem é fã de terror, precisa assistir. Quem é fã de cinema, tem a obrigação de ver. E quem nunca viu por medo, precisa tomar coragem e apreciar essa obra prima, mesmo que comprometa suas futuras noites de sono. Afinal de contas, são só uns diazinhos sem dormir. Nada de mais!