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Corsage retrata o machismo estruturado sob a ótica de uma imperatriz (Crítica)

Corsage, de Marie Kreutzer, faz um retrato da corte imperial sem trazer o luxo em primeiro plano

Publicado em 21 de janeiro de 2023, por Críticas

Se formos analisar a História da Arte conseguimos perceber diversos padrões de beleza, principalmente na representação da figura feminina. E ao ver as representações das Vênus, por exemplo, conseguimos perceber a mudança. A Vênus de Willendorf possui curvas de corpo voluptuoso, tratando-se de uma representação pré-histórica. Na Grécia Antiga, já temos uma outra representação: um corpo magro e musculoso. Esse padrão era seguido devido ao padrão atlético que a elite grega possuía devido ao seu poderio militar, representado na Vênus de Milo. Durante o Renascimento, momento que retomou características da Grecia Antiga para criar artisticamente, temos a Vênus de Boticelli, um corpo magro, mas com curvas sem procurar a perfeição muscular. Desde então, a procura pelo padrão é pelo corpo escultural magro malhado ou magro com curvas.

Durante o período das Monarquias, a procura pelo corpo perfeito não parou. Debaixo de camadas e camadas de tecido de vestidos luxuosos, as mulheres usavam o espartilho ou o Corsage — acessório de moda que leva o nome do filme —, para afinar a cintura e dar volume aos seios, até para as mulheres que não tinham muito. Quanto mais apertado, mais fina a cintura fica. Mesmo com o desconforto para sentar, andar, respirar, a expectativa era ter a cintura fina. No filme, esse acessório de tortura é mostrado na área da lombar roxa pelo exagero em afinar a região. Essa procura pela Imperatriz da Áustria, Elisabeth (Vicky Krieps), pelo corpo fino e magro reflete em outro ponto, o filme começa um pouco antes dela comemorar seu aniversário de 40 anos.

Pela expectativa de vida da época, Elisabeth não era mais considerada jovem. Esse etarismo que sofre reflete em sua procura por um corpo fino e magro, de quando era mais nova e não tinha filhos. Então, além de procurar esse corpo pelos acessórios, Elisabeth também faz regime ao não comer praticamente nada ou não se alimentar.

Porém, em uma cena de um jantar, o qual comemora o aniversário de 40 anos, onde envolve a corte austríaca, os empregados vão tirar os pratos da mesa, os pratos dos homens estão mexidos e das mulheres estão intactos. Representando que desse mal não é somente a imperatriz que sofre, mas sim todas as mulheres. Além de corpos esculturais, outro ponto que o filme aborda é os cabelos longuíssimos. Elisabeth, quando se ajeita para dormir, desfaz seus penteados. Seus cabelos chegam na cintura. O cabelo comprido também traz um sinal de fertilidade. Assim se “cultiva” cabelos longos para trazer essa sensação, mesmo que ele esteja preso com penteados, mas quanto mais cabelo, mais grandioso será o penteado. Pontos esses que não são representados nos homens, eles podendo usar seus cabelos e corpos da forma que quiserem evidenciam como o machismo é estruturado dentro da corte sem ser explícito, em diversas vezes.

Muito se sabe que, principalmente na Corte, os relacionamento extraconjugais aconteciam. Sem mostrar que esses relacionamentos de Elisabeth eram consumados, trazendo apenas sugestões por meio da tensão sexual, a personagem já era alvo de fofocas e, por isso, devia parar de conversar com esses homens os quais atraia olhares. E isso é algo bem diferente do que acontecia com seu marido, o Imperador Franz (Florian Teichtmeister), que flertava sob vários olhares. Essas coisas mostravam como Elisabeth era podada por seu jeito e para se encaixar num temperamento, culminando em uma tristeza muito grande.

Essa representação só é possível porque Vicky Krieps está desempenhando uma performance impecável, como sempre, mas essa se destaca. Vale destacar que Kripes ganhou o prêmio de melhor perfomance feminina em Cannes na seleção de filmes Um Certo Olhar, além do prêmio de melhor atriz em Sarajevo, Chicago e várias outras nominações. E essa forma de representação feminina foi possível, também, pois a direção é sob o olhar feminino de Marie Kreutzer, que também recebeu a indicação para concorrer ao prêmio de Cannes de melhor filme da Mostra Um Certo Olhar. E, por isso, a representação feminina é muito subjetiva trazendo uma beleza para o filme e o machismo sem ser algo panfletário.

Corsage traz uma representação da Monarquia diferente do que estamos acostumados a ver na história do cinema. Além de que o filme só conseguiu ser filmado em uma diversidade de idiomas falados por conta de Krieps que é poliglota, algo que trouxe o luxo da monarquia por meio da moda e da cultura. Aliás, a moda coube em diversos figurinos com cores sóbrias, cortes e acessórios para enfatizar não só uma imperatriz com a idade que tinha, mas a elegância que tinha e era conhecida por tal. Desse modo, Corsage traz um retrato que merece ser visto e apreciado por sua qualidade de produção.

Corsage
Corsage
2023
Marie Kreutzer
Marie Kreutzer
Imovision

Nota: 5

Nota: 5

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Amo música, cinema, artes visuais e cores. Gosto de descansar vendo filmes e, as vezes, isso acaba cansando também. Sou graduada de Cinema e Audiovisual.