EYEYE é o fim de um ciclo doloroso para Lykke Li (Review)
Pela primeira vez, a artista propôs um disco audiovisual com delicadeza, intimidade e imersão
Publicado em 3 de julho de 2022, por Carlos Bueno • Lançamentos, ReviewsLykke Li é um cantora e compositora sueca que, neste ano, lançou seu quinto álbum de estúdio intitulado pelo homônimo de “I”: EYEYE. A artista é conhecida pelo seu jeito único de cantar ao lado de composições extremamente deprimentes e angustiantes. Aos 21 anos, Lykke lançou seu debut album Youth Novels em 2008 e em seguida participou da trilha sonora de Crepúsculo: Lua Nova (2009) com a canção “Possibility” em que teve um de seus BOOMs. Quem nunca chorou nessa cena com a Bella Swan (Kristen Stewart) em depressão né? Posteriormente a cantora veio a ser reconhecida pelo hit, presente em seu aclamado segundo disco Wounded Rhymes, “I Follow Rivers” — por conta de um remix que hoje já conta com mais de 350 milhões de streams no Spotify.
Em 2014, a cantora lançou um de seus mais icônicos trabalhos I Never Learn que caracterizava a discografia da artista, consagrando o seu passado e ditando os próximos passos de sua carreira. Talvez por um som mais lento que não seguia as estruturas de hits, suas canções não hitaram tanto, mas já chegaram a passar no fundo de uma reportagem do globo esporte! (Não achei o vídeo, mas nada apaga esse momento da minha mente, a faixa era a que dá o titulo ao disco). Quatro anos depois, a artista lançou so sad so sexy, um disco diferente que envolvia novos gêneros, mas que na época pode não ter sido apreciado devidamente.
E agora, mais quatro anos se passaram. Então, Lykke dá continuidade à sua discografia com um trabalho mais íntimo que os anteriores, mais cru e verdadeiro: EYEYE. O disco conta com a produção do amigo de muito tempo da artista Björn Yttling, que contribui para a criação da atmosfera excêntrica do disco que mescla as influências de seu trabalho passado, com as marcas de I Never Learn. O disco possui apenas 33 minutos e 33 segundos, de acordo com a cantora, ela tornou-se obcecada pelo numero 33, e até mesmo a gravação foi feita em 33.33hz.
O projeto é aberto com o lead-single “NO HOTEL”, que ao longo de praticamente zero instrumentais (bem ausentes no disco no geral), a artista projeta de forma crua sua dor e seu relacionamento passado, em que ela deseja voltar. Todo o relacionamento no disco é tratado como um vício, e em “YOU DON’T GO AWAY” a compositora demonstra essa dificuldade em largar sua dependência em que ela quer que seus sentimentos vão embora, mas ao mesmo tempo imploram para salva-los como na faixa anterior.
Seu encerramento é uma transição para “HIGHWAY TO YOUR HEART”. A faixa é aberta com a frase “Spun around your side for so long/Thought maybe time would catch on” que está ligada diretamente com o conceito trazido no nome do disco e em outras faixas como “CAROUSEL”, a mesma frase é a que encerra a canção. Uma sensação de repetição, um loop infinito de uma relação tóxica e a impossibilidade de largar aquilo. Na faixa, a artista pergunta de forma simples: existe alguma rodovia para seu coração? A faixa capta mais sensações que as duas faixas anteriores, e emocionam. O longo encerramento com a construção de uma bridge bem feita são ótimos aqui.
De longe, “HAPPY HURTS” é a música mais dolorosa e fascinante aqui. Talvez o efeito na voz e sua produção, enquanto Lykke Li demonstra sua obsessão por seu amante sejam responsáveis. Como dito anteriormente, EYEYE é um álbum audiovisual, e tudo isso é descrito nas composições em pequenos detalhes. Assim como na canção anterior, o encerramento é o que traz todo o destaque para a faixa. O momento intimista e os efeitos reverse dão a impressão de reviver uma história na sua mente. O clipe da faixa demonstram e elucidam essa sensação de obsessão, repetição e são essenciais para viver as emoções transmitidos.
“CAROUSEL” apesar de encaixar-se perfeitamente no conceito e apresentar letras interessantes, sonoramente a faixa não é tão interessante depois de algo tão majestoso quanto “HAPPY HURTS”. Voltando aos aspectos cinematográficos e de vícios, a artista mistura significados ao perguntar se seu amante a ama em “5D”, expressão que dá titulo a faixa. Com 5D, a artista mescla os conceitos de filmes 5D (aqueles que misturam diversos sentidos além do visual, como o olfato, motor e de temperatura para criar alguma sensação) e o do uso da droga psicodélica 5D (5-MeO-DMT) — conhecidas por “elevar” seu estado humano.
Um fechamento bruto nos leva a “OVER” que é aberta diferente de todas as faixas anteriores. Representando aquele fim, o desfecho, o término. À fim de voltar a esse estado de vício, a personagem da faixa pretende suprir sua necessidade de outra forma, já que ela não quer estar sóbria. A produção aqui é bem repetitiva, tendo alguns sons que incomodam, mas assim como na maior parte das canções do disco, a bridge reconquista por alguns segundos, mas posteriormente tem-se novamente o refrão que não inova e permanece na zona de conforto.
Para concluir, temos a única faixa que não possui seu título em letra maiúscula “ü&i”. De forma simples, Li fala que o filme é sobre “eu&você”, por isso esse nome. A faixa é o climax do disco e podemos ouvir frases revertidas, assim como na abertura em “NO HOTEL” parecendo fechar o ciclo e iniciando o novamente. A faixa conta com 7 minutos e 12 segundos, com o seu encerramento representado a personagem da artista num local, coberta de água da chuva, simbolizando a tristeza e a solidão. De certa forma, essa canção é a mais barulhenta do disco, seus últimos minutos (dá música mesmo, não o encerramento) possui tantas camadas que é difícil se concentrar, o objetivo aqui é sentir.
Dessa forma, a cantora representou suas ideias de forma excêntrica, não feita antes em sua discografia. Com um disco audiovisual, EYEYE representa para a artista o fim desse ciclo de escrever canções sobre amores passados, este momento depressivo vivenciado por ela, a autodepreciação, o vício e todas as outras camadas abordadas aqui. Apesar do disco conter algumas faixas que são desinteressantes, os pontos altos compensam os momentos em que a repetição fica excessiva, e juntam as características prazerosas de seus trabalhos passados, comprimindo-os em um único trabalho.

7.9