Nymph: Shygirl segue reconstruindo o eletrônico à sua maneira (Review)
Em seu debut, a artista britânica abre espaço ao novo sem abandonar suas raízes
Publicado em 24 de outubro de 2022, por Lucas Ricci • Lançamentos, ReviewsA cantora britânica Shygirl está presente na indústria musical desde 2016, quando lançou o single “Want More” e criou a gravadora NUXXE em parceria com Sega Bodega e Coucou Chloe. Ao longo de 6 anos, a artista se dedicou a diversos singles, parcerias e o lançamento de dois EPs, Cruel Practice (2018) e Alias (2020). Agora, em seu primeiro álbum de estúdio, Shygirl reúne anos de experiência em um projeto que reflete sua trajetória e influências musicais de forma moderna e revigorante.
O trabalho de Shygirl sempre foi muito marcado por músicas eletrônicas explosivas, cheias de energia sexual, dignas de pistas de dança sujas de clubes lotados. Em Nymph, a artista parece seguir o caminho contrário, mantendo algumas características marcantes de sua música, como o poder sexual, mas agora de maneira diluída e introspectiva. Aqui, a cantora aposta em um eletrônico mais calmo, e vezes até ambiente, explorando pop, R&B e Hip hop influenciado pelo final dos anos 1990 e começo dos anos 2000.
A faixa de abertura do álbum, “Woe”, é um bom exemplo dessa mistura que dá tom a todo o álbum. Abrindo com um sample do pop alternativo de “Bunny Is A Rider”, de Caroline Polachek, ela continua em um eletrônico íntimo que seguido de um verso de rap que acelera a canção até seu retorno à calmaria. Tudo isso embala uma composição que aborda o desejo de forma íntima e particular. A produção de Sega Bodega e Karma Kid é efetiva em amarrar diferentes elementos sem ser desconexa e gritante.
Entretanto, não são em todos os momentos de Nymph que a produção brilha, o que é o caso de “Come For Me”, produzida por Arca e Shygirl. Ambas são umas das figuras mais notáveis e inovativas da música eletrônica, assim, suas parcerias são comemoradas e esperadas com grande expectativa. Infelizmente, essas expectativas não são alcançadas e o resultado é decepcionante. A produção usa batidas descontruídas e sintetizadores de forma desinteressante e até repetitiva. A escrita da canção também não se destaca, que tem como único ponto positivo os vocais de Shygirl, mas que fazem pouco nessa experiência frustrante.
Em seguida temos “Shlut”, um definitivo ponto alto do projeto. A canção é recheada de energia sexual e erotismo, transposta por uma escrita que fala sobre desejo e sexo de forma empoderada com um quê de romantismo. A performance vocal de Shygirl é sexy e sedutora, com um rap assertivo e provocante ela questiona “Is it so bad to just like to be touched?” (É tão ruim apenas gostar de ser tocada?). O instrumental abraça bem esses elementos com uso inteligente de graves e acordes de violão que se complementam, adicionando ainda mais camadas a música.
Contrastando “Shlut” temos a faixa “Firefly”, na qual Shygirl se despe do erotismo empoderado para dar lugar a vulnerabilidade. “I’m a fool and I know” (Eu sou uma tola e eu sei) a cantora admite ao falar sobre uma relação frustrante e o sentimento de ter sido enganada por um interesse amoroso. As batidas descontruídas trazem a sensação de algo que é constantemente interrompido, cria-se uma ansiedade como se a produção estivesse esperando um elemento que nunca vem, assim como a voz lírica espera por seu amor.
Shygirl traz uma virada própria a músicas sobre Booty calls em “Coochie (a bedtime story)”, usando diversas imagens de duplo sentido em sua composição, a canção emula uma versão desinteressante do pop inspirado nos anos 2000 de PinkPantheress. Porém, não é sempre que esse apego a estética Y2K é falho, como em “Heaven” e “Nike”. “Heaven” traz uma produção envolvente, uma linda composição e uma performance vocal encantadora. Em “Nike” a artista parece reinventar o clássico pop “Hollaback Girl” em sua produção com batidas potentes que se misturam com uma abordagem de HipHop, um dos maiores atrativos de Shygirl.
A cantora retorna ao eletrônico desconstruído de seus projetos anteriores em “Poison”. Retomando o som do seu EP “Cruel Practice”, Shygirl o mistura com sintetizadores dignos do Eurodance da metade dos anos 2000 em uma produção revigorante e pulsante. Já em “Honey” a cantora volta um pouco mais no tempo para se inspirar no techno ambiente de Aphex Twin em uma música que se apoia na produção calma para apostar em uma letra íntima.
No geral, Nymph é um sólido debut que demonstra diversas facetas da artista que é Shygirl. Nesse projeto ela expande seu poder sexual de obras anteriores e o explora de maneiras diferentes, permitindo também espaço para ser vulnerável e pessoal. O álbum faz um ótimo trabalho desconstruindo e misturando múltiplos gêneros e seus aspectos com uma produção que, em sua maioria, se mostra interessante e original. Nymph expõe o vasto conhecimento de Shygirl sobre música eletrônica e demonstra que seja para o pico de uma festa ou o começo dela, ela tem a canção perfeita.

7.6