RENAISSANCE é sobre orgulho, liberdade e empoderamento da comunidade negra (Review)
Um álbum maduro, cheio de histórias para contar e repleto de referências da vida pessoal e da carreira da cantora
Publicado em 1 de agosto de 2022, por Felipe Soares • ReviewsBeyoncé acaba de lançar um novo álbum inspirado nos discos houses, que embalaram as baladas na década de 1980 e 1990. Grandes nomes de sucesso da época como Big Freedia, Donna Summer, Atia Boogs estão creditados ao novo projeto da cantora. O Renaissance chegou para embalar as pistas de dança mais uma vez. Relembrar como as coisas eram diferentes há quase três décadas, como os estilos musicais mudaram e como produzir música diferente da projeção do mercado atual, é importante para reforçar a identidade de um artista.
Nos anos 1990, as músicas eram feitas para dançar, num mundo onde nem se podia imaginar as dancinhas dos aplicativos de 2022. O álbum conta com 16 faixas, incluindo o hit de sucesso “Break My Soul”, que já conquistou o coração da maioria dos fãs de pop. O que se pode dizer dessa primeira etapa do projeto, é que Beyoncé elevou o patamar de artista. A cantora, ao longo da sua carreira, deixou de ser o produto perfeito do mercado fonográfico da música norte-americana para ser ela. O intitulado “Act I” traz esse resgate musical.
A cada faixa, Beyoncé deixa claro que suas músicas não são mais para agradar gravadoras, alcançar grandes patrocinadores e hitar nas principais paradas ao redor do mundo, ela por si só já faz isso. Beyoncé quer fazer música sendo Beyoncé, até porque como ela mesmo diz na faixa “Alien Superstar”, ela é a número um e é a única.
A artista, aos seus 40 anos, reconhece o seu impacto em qualquer cenário. Desde o álbum Lemonade (2016), ela se empodera disso. Tanto que ela trata de assuntos mais complexos em suas músicas, ela fala de amor, empoderamento negro e racismo. Coisas que a mesma não falaria no início da carreira de maneira tão explícita. Volto a repetir, Beyoncé deixou de ser o produto ideal do mercado e passou a ser artista, com autonomia para dizer coisas que a ex-Destiny Child dos anos 2000 não diria.

Em todas as produções há um toque de perfeição da cantora, ela faz questão de manter esse patamar faixa a faixa. (Columbia Records/Parkwood Entertainment/Reprodução)
Renaissance é completo, vivo e empoderado. As transições de uma música para a outra são incríveis, dão aquele ar de ‘non-stop’, como se estivesse realmente em uma balada dos anos 1990. Ela mistura pop, house, dance music, afro-tech, batidas leves de R&B e muitas outras coisas que incorporam o álbum.
“I’m That Girl” é a música de abertura do álbum. Com uma introdução mais puxada para o techno, logo se mistura a umas batidas mais sensuais, como se fosse dado o primeiro passo de liberdade pela cantora. O som é crescente e logo vai sendo incorporado com ritmos mais cheios, fazendo uma transição suave para a faixa “Cozy”. A faixa seguinte tem uma pegada mais balada. Com o passar da música, o som vai ganhando corpo e se torna cada vez mais dançante. É uma faixa repleta de empoderamento, aceitação e liberdade da cultura negra no house music. Com “Alien Superstar”, a terceira música do álbum, começa com a cantora declarando seu posto de única. O hit logo ganha destaque para faixas voltadas ao vogue. Essa faixa você ouve já pensando “hoje é dia de me jogar na pista”.
“Cuff It” é de longe um dos grandes destaques do álbum. Ao contrário das primeiras faixas, essa é alegre e super dançante. Música que lembra muito o gênero do soul oitentista. Com vocais impecáveis, Beyoncé sente a música, fica a vontade e leva o ritmo da melhor maneira possível. (A minha preferida do álbum!). A transição para essa faixa é quase imperceptível para a música “Energy”. No início ela segue quase as mesmas batidas da anterior, mas logo trocou pelo ritmos de Afro-Tech. A faixa lembra muito as músicas feitas pela cantora no álbum especial feito para o live action de Rei Leão (2019).
O lead single da nova era, “Break My Soul” já é carta marcada. Tendo o som de Big Freedia, Beyoncé dá uma nova crescente do house music do álbum. A letra clama por liberdade, seja do trabalho e das más relações. Chegamos a “Church Girl”, a cantora usa das suas referências vividas dentro da igreja para dar uma virada de chave aqui. A música fala sobre a liberdade do corpo negro, livre de julgamentos e cheio de vida para ser vivida (essa ganhou meu top espaço no meu top 5 bem fácil).
Em seguida vem “Plastic Off the Sofa”. Sexy é a palavra que define essa faixa. É uma quebra no meio do álbum, que vinha cada vez mais crescente. A faixa é mais lenta e lembra muito as músicas de James Brown, que também fala muito sobre o prazer de estar junto com quem ama. A nona faixa do álbum, “Virgo’s Groove”, foi construída em cima das batidas do house. Muito gostosa de ouvir, com um ritmo que conquista qualquer um que ouvir. Nessa música, Beyoncé trabalha muito as vozes de backing vocal e vozes secundárias. Linda do começo ao fim! (Na lista das preferidas também, se não a melhor).
“Move” traz de volta o afro-tech. A faixa é muito parecida com a música “My Power”, também do álbum especial do Rei Leão. Definiria a música forte e poderosa. “Heated” é puxada para o pop e aqui Beyoncé esbanja como é ser rica e poderosa. Ao final da música, a cantora dedica trecho ao seu tio Jhonny, do qual foi vetor de inspiração para Beyoncé.
Com “Thique” o vogue se faz presente no álbum. A importância dos vocais secundários também são os destaques no final da faixa que já logo envolve a música “All up in your mind”. Na faixa seguinte, o ritmo chega mais ameno, sem muito para onde ir, mas com o nível de excelência que Beyoncé queria que o álbum tivesse a essa altura. Essa é uma faixa que facilmente você vai ouvir em qualquer loja de departamento nos próximos meses.
“America has a problem” é incrível do começo ao fim. Beyoncé usou de toda a sua criatividade com a faixa escrita por Kilo nos anos 90. Com um flow característico das suas últimas produções, a cantora leva qualquer um dos boomers as pistas facilmente. Como uma ótima virginiana, Beyoncé preza pela excelência e é isso que a faixa “Pure/Honey” trás. O vogue toma conta e a transição dentro da própria música a deixa ainda mais incrível. Puramente sedutora, fazendo você se convencer de que o mundo está ao seus pés e não há ninguém acima de você.
“Summer Renaissance” foi a escolhida para encerrar o álbum. Com o sample de “I Feel Love”, de Donna Summer, a música super deliciosa, dançante e viva. Beyoncé encontrou a maneira certa de encerrar seu álbum com uma música alegre e cheia de brilho, bem como a proposta do álbum.

Renaissance foi pensado para agradar todos os públicos, mas principalmente para alcançar o público jovem preto. (Columbia Records/Parkwood Entertainment/Reprodução)
Como um todo, Renaissance tem potencial para grandes hits, além do lead single “Break My Soul”, as músicas “Alien Superstar”, “Cuff it”, “Pure/Honey” e “Summer Renaissance”, se destacam no projeto e podem subir com força total nos charts ao redor do mundo nas próximas semanas. A cantora que sempre revolucionou o cenário musical, sabendo disso, optou por nesse primeiro ato se distanciar da produção visual, dando destaque somente à produção sonora. Mas com um álbum tão cheio de músicas dançantes, a produção de videoclipes talvez pesaria demais para essa nova proposta de Beyoncé.
A própria confirmou que esse é um projeto em três atos. Mas o que se pode esperar de Beyoncé nos próximos meses? Não sabemos responder. Uma coisa é certa, não teremos decepções. Na internet, já estão tendo algumas especulações de que, talvez, a cantora passe por seus projetos antigos, começando com um álbum de dance/house, que influenciou na sua juventude, passando para batidas mais pop e R&B do início dos anos 2000, que revelou Beyoncé com um destaque musical, e encerrando com o terceiro álbum mais para o pop perfection, que há anos os fãs imploram para a cantora. Mas claro, são rumores e nada ainda foi confirmado.
O importante é agradecer que Beyoncé nos deu Renaissance de presente. O álbum é único, forte e sexy do começo ao fim. O “Act I” é também sobre liberdade, felicidade e empoderamento tanto para ela, quanto para nós ouvintes. E o que nos resta é dar stream aproveitar o álbum e ficar de olho nos próximos passos do que pode vir por aí, até porque Beyoncé sempre é uma incógnita.

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