Halo: 1ª temporada foge do jogo para criar sua própria história de origem (Crítica)
Série baseada na franquia adquirida pela Microsoft é totalmente diferente na nova mídia
Publicado em 23 de maio de 2022, por Guilherme S. Machado • CríticasFugindo do universo criado pelos jogos, a série de Halo, disponível no Paramount+, cria seu próprio universo de ficção científica com algumas semelhanças ao que existe na Microsoft mas ainda assim com um abismo entre esse material. A história narra Master Chief/John (interpretado por Pablo Schreiber) como comandante de um grupo militar chamado Silver Team, formado por quatro Spartans, guerreiros geneticamente modificados e de sólidas armaduras. Logo no primeiro episódio, é possível entender o tom da série como “adulto-pesado”, pois existe muito sangue, gore e personagens sendo “esfarelados” diante da tela. Esse gore tão direto acabou não retornando mais nos episódios seguintes, mas o tom adulto se manteve.
Sendo assim, Halo teve uma 1ª temporada que estabeleceu um universo novo, tanto para quem leu os livros e jogou os jogos quanto para quem apenas viu a série (meu caso). E é tudo muito interessante. Há um estratagema político formado desde o episódio 2 crescente, comandado pela Doutora Halsey (Natascha McElhone) que controla os Spartans e tem interesses paralelos ao governo da UNSC. Ela esconde dos Spartans suas origens e os faz agir em campo de batalha sem nenhuma emoção, o que gera um plot bastante comum a filmes e séries, e que no formato de série de TV funciona bastante ao criar drama e arcos que permeiam vários episódios: o arco de autodescoberta num mundo, levando o espectador numa jornada junto ao protagonista. Esse é um dos primeiros detalhes que fogem ao jogo, pois o Master Chief dos jogos parece bastante um robô, e o da série está descobrindo os próprios sentimentos.

(Paramount+/Reprodução)
Nesta história, que acaba por se mostrar uma história de origem, outras tramas paralelas se formam: a de Kwan Ha (Yerin Ha) e Soren (Bokeem Woodbine), que mostram alguns outros cantos dessa galáxia como o planeta desértico e periférico Madrigal e a colônia de piratas. Esta linha narrativa no entanto foi mantida à exaustão, sendo que seu desenvolvimento na prática é muito curto. Os únicos momentos realmente relevantes para Kwan Ha são a perda do planeta, refúgio com os piratas, volta à terra natal e descoberta de seu destino junto a John. Isso tudo caberia facilmente em dois episódios, mas a personagem acaba se repetindo como uma adolescente birrenta por seis deles, o que desgasta e a deixa com uma legião de haters.
O principal antagonista a Kwan Ha, Vinsher (Burn Gorman), lembra vilões de séries com pegada mais adulta, como Game of Thrones, The Boys, A Roda do Tempo, por exemplo, mas em certos momentos soa caricato, com sua voz rouca e devaneios de riqueza em suas jacuzzis. Todas as situações em Madrigal poderiam ser mais empolgantes de serem assistidas mas a série torna isso falho o tempo todo. O planeta aparenta ser uma colônia com bastante descendentes de asiáticos e no episódio 7 é revelado um conhecimento ancestral que aparenta ser muito rico, mas neste momento os espectadores já estavam com raiva de Kwan e essa parte da mitologia passou, para muitos, batida.

(Paramount+/Reprodução)
Quanto a segunda linha paralela de narrativa temos Makee (Charlie Murphy), uma humana sequestrada pelo Covenant — grupo de aliens que pode ser considerado principal vilão da temporada — é bastante confusa no início, ao mostrá-la como irmã destes alienígenas pois seus desejos se tornam ambíguos e ela parece estar do lado deles. Novamente com um clichê, ela passa para o “lado do bem” ao conhecer John e tentar se conhecer nas belezas do planeta Terra e na convivência com os humanos. Apesar de interessante de assistir é um formato de crescimento de personagem bastante batido.
Diante de tantos clichês, a trajetória de Vannak-134/Kai (Bentley Kalu) é uma personagem que causou empolgação nos fãs, por também passar pelo processo de Master Chief ao descobrir ela mesma, desativando em seu cérebro o que a faz se sentir apática às emoções humanas. A personagem se torna mais desbocada, pinta o cabelo, trama próprias investigações e adquire um senso de humor. Tudo muito orgânico e de maneira carismática. Pablo Schreiber (que eu conhecia apenas por American Gods como o Leprechaun) dá tons mais densos ao personagem de John, que é crível o tempo todo em sua angústia de descobrir o passado. Mas o personagem também é bastante impessoal, que não o deixa tão relacionável com o público.
Um dos maiores desgostos da audiência também foi a não-utilização do capacete pelos combatentes do Silver Team. Nos jogos, eles acabam utilizando o capacete o tempo todo e na série estão sem o capacete durante muitos momentos. Em partes, entendo e até apoio essa pouca utilização, pois a ausência de emoções faciais abrem uma margem muito grande para as atuações se tornarem robóticas.
Em The Mandalorian, por exemplo, em que o protagonista também está com o capacete 90% do tempo, em várias das cenas o ator Pedro Pascal não estava presente no set, apenas fazendo trabalho de voz posteriormente. Hollywood possui uma aversão a este tipo de papel pois deixa de associar o corpo, a beleza e expressões do ator à imagem da série, pertinente para a venda do material pelo Star System. Mesmo assim, em momentos de tensão e às vezes início de batalha os Spartans não usam sempre seus capacetes, o que dá uma sensação que eles podem morrer a qualquer momento de maneira “burra” devido a mitologia que a série mesmo impõe, ao dizer que as armaduras são super resistentes.

(Paramount+/Reprodução)
A personagem Cortana (voz de Jen Taylor), veio como uma grata surpresa para mim, que sempre estive acostumado com IAs sendo representadas por atrizes em live-action, e aqui, ela se assemelha muito mais aos jogos ao ser uma avatar 3D — não-ironicamente parecida com a Lu do Magalu — que dá um outro tom à personagem: se coloca como artificial, mas suas atitudes a tornam mais humanas durante a temporada. Logo, é um deleite acompanhar as expressões da boneca de CGI e conseguir ver algum tipo de conexão com ela. Em 2022, parece fazer mais sentido as IAs retratadas como avatares devido à explosão de representantes virtuais de marcas e das tentativas de inclusão do metaverso.

(Paramount+/Reprodução)
No geral, Halo acerta muito em escolhas e faz valer seu orçamento de aproximadamente 90 milhões de dólares. Seu universo possui múltiplas abordagens e suas lutas estão realmente bem dirigidas e próximas à jogos de RPG e Coop. Nas lutas, me senti esperando os inimigos serem atingidos e até alguns personagens tinham a “aura” de chefões de fase. Seus erros no entanto não passam despercebidos e suas diferenças aos livros e jogos incomodam sim àqueles muito apegados ao material original. O final da série deu uma brecha para as atitudes de Master Chief se tornarem mais robóticas como o jogo mas acredito que não irá durar por muito tempo. Para a 2ª temporada, resta saber se abraçarão a mitologia nova que criaram ou se a série se encaixará mais ao que se espera dela.

Nota: 3.5
